Sinto frequentemente uma falta das coisas; às vezes, beira o oposto sem que eu mesmo perceba, vai desse vazio à sensação de gordura espiritual. Como quem estivesse vivendo coisas demais para digerir. No fundo, ambas as sensações parecem traduzir uma coisa só. A impossibilidade de conduzir os pés pelo mundo. E nesses momentos a única dieta apropriada para uma cura, ao menos, paliativa, que encontro, é usufruto da arte. Produzir e digerir arte em doses calavares...
Esta é a única ferramenta que nessas horas me sobra para conhecer-me um pouco mais, racionalizando e sublimando as situações. Se me é suficiente, não sei. Mas prefiro pensar que a atitude perfaz o ciclo retroalimentar da inspiração artística, que se alimenta de feridas, curando algumas, mitigando outras. Ocorre que por óbvio desígnio que o ofício do artista tem, alguns cortes se fecham, outros se somatizam pelo corpo, permanecendo como contínua fonte de recursos temáticos da produção artística. As consequências que já observei disso são tantas outras que caberiam num ensaio aparte. Portanto, diante disto, prefiro recorrer a um belíssimo insight de Ferreira Gullar, que vi, pela primeira vez, escrito numa parede do museu nacional de belas artes, ao tom de um vermelho firme e forte: “A ARTE EXISTE PORQUE A VIDA NÃO BASTA”
Hoje, dedico à arte o meu culto e a minha adoração. E, na troca de um minuto de silêncio, proponho um dia de abstração das arbitrariedades que a vida traz. Se o artista é só, se não lhe enseja a oportunidade de um ombro verdadeiramente amigo, que não por isso se abstenha, mas que tome o dia para se reconciliar consigo mesmo. Que se desfaça dos laços mais doridos que os relacionamentos lhe empunhem pelo entorno da traqueia, do peito, ou de onde se lhe atem tais laços.
Tracem, hoje, um grande manifesto pela libertação!
Um comentário:
Que a arte possa curar as feridas que a fizeram.
Um brinde ao profano!
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