Atos

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sexta-feira, 17 de setembro de 2010

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"Take these broken wings and learn to fly"

Noto que mesmo que eu evite em certos momentos que a expressão me venha a tomar posse e escrever qualquer coisa, participar da maldita criação literária, não consigo fugir de sair colhendo palavras pelos cantos. Não sei o que é pior...

Provavelmente, devo cessar por um período indeterminado as postagens aqui. E que a quem tenha o costume de ler-me possa receber e aceitar minhas prévias desculpas.

domingo, 22 de agosto de 2010

Não tenho pressa: não a têm o sol e a lua. (20-6-1929)

Não tenho pressa: não a têm o sol e a lua.
Ninguém anda mais depressa do que as pernas que tem.
Se onde quero estar é longe, não estou lá num momento.

Sim: existo dentro do meu corpo.
Não trago o sol nem a lua na algibeira.
Não quero conquistar mundos porque dormi mal,
Nem almoçar o mundo por causa do estômago.
Indiferente?
Não: filho da terra, que se der um salto, está em falso,
Um momento no ar que não é para nós,
E só contente quando os pés lhe batem outra vez na terra,
Traz! na realidade que não falta!

Não tenho pressa. Pressa de quê?
Não têm pressa o sol e a lua: estão certos.
Ter pressa é crer que a gente passe adiante das pernas,
Ou que, dando um pulo, salte por cima da sombra.
Não; não tenho pressa.
Se estendo o braço, chego exactamente aonde o meu braço chega (
Nem um centímetro mais longe.
Toco só aonde toco, não aonde penso.
Só me posso sentar aonde estou.
E isto faz rir como todas as verdades absolutamente verdadeiras,
Mas o que faz rir a valer é que nós pensamos sempre noutra coisa,
E somos vadios do nosso corpo.
E estamos sempre fora dele porque estamos aqui.


“Poemas Inconjuntos”. Poemas Completos de Alberto Caeiro. Fernando Pessoa.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Dos diálogos incompletos II

Em algum lugar da livraria...

– Eu estive pensando há pouco e cheguei a concluir, que a arte é deveras inadequada. Comecemos pelo custo. Sim, qualquer arte. Olhe, por exemplo, as obras plásticas, as pinturas, os espetáculos cênicos, o cinema...

– Sim, continue.

– A boa obra de arte não cabe no custo de um bom produto. O custo de um bom espetáculo nos teatros é muito alto para o brasileiro comum. Uma proporção pequena da sociedade tem permissão financeira para pensar no valor da arte. E não vale tentar consumi-la, sem pensá-la, pois se necessita primeiro compreender o que é arte.

– Deixe-me, tirar uma dúvida, um livro no sebo ou um disco ao custo de eletricidade também entram no rol das coisas financeiramente inacessíveis?

– A literatura é ainda pior. É como um tiro no escuro como fosse num mercado de finanças. Pois não se vê uma prévia do trabalho. Compra-se às cegas. E, atualmente, às cegas é que se tem produzido literatura. Portanto, é um risco; risco igual se oferece ao tateio da música. O custo é uma compensação, pois você sabe que o mau tato para estes assuntos se cria pelo contato obtido com a má obra. A escolha é o resultado de uma construção pessoal que leva em conta “por em referência aquilo que se tem anteriormente como arte”. E essa referência só se desenvolve com grandes obras.

– Sugere que esperemos ela extinguir-se, enquanto conversamos, e, daí então, figurar, finalmente, num museu de incompatibilidades humanas ou de paradoxos desenvolvimentistas?

– Não... Não aguardaria séculos por isso. Apenas observo e exponho certas coisas. Nada mais.

– É por isso que não se vive de arte, pois não se vive de cinzas.

– É, talvez esteja certo, já matamo-la. Contudo, nunca se sabe se há de ser dado um novo suspiro. A arte não se rende aos meandros da razão humana.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

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– O que há, rapaz? Andas estranho.
– Meu pai matou um frango.
– É?
– É.
– ... sinto muito.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Novas

Passeando há algum tempo por esses bits virtuais encontrei uma ferramenta que me chamou, à hora, muita atenção; explico brevemente.

Não sou grande adepto dessas ferramentas de internet. Há já um ano, aproximadamente, exclui meu perfil pessoal no orkut, não possuo facebook, twitter, ou qualquer ferramenta de interação similar. Mas, recentemente, conheci uma outra proposta de interação social que me captou. Talvez, por recordar-me de experiência própria similar. Essa ferramenta propunha fazer algo que por acaso tive a experiência de experimentar há alguns anos. Bom, eu falo aqui do "formspring.me".

Dois anos passados, conheci pela internet, de forma bem curiosa, alguém muito especial para mim. Conhecemo-nos, a bem dizer, trocando perguntas e respostas... existencialistas. O fato às vezes nem me parece muito crível. Foi um primeiro contato não muito usual, é certo, mas tudo aquilo que dali para adiante tive o prazer de sentir me marcou de modo tal que não sai mais de mim, e guardo ainda essa pessoa no peito com muito carinho.

Mas enfim, toma-se isso como justificativa, o que abro agora é um espaço de interação, para quem dúvidas tenha guardadas na gaveta ou que apenas curiosidade possua. Fica linkado ao blog um novo endereço, uma caixa postal de perguntas, que sérias ou não me proponho a responder.

O endereço é... http://www.formspring.me/Antonione

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Da Moral

Fazer ou deixar de fazer algo corresponde para mim apenas uma resposta a estrutura moral que conservo, eu a mim comprometo-me a não me desviar propositalmente desse fim moral buscado. Mas isso difere de querer abster-me do imprevisto da “quebra” de valores morais, pois quanto aos desejos, a estes atribuo minha plena liberdade, e não poderia deixar de ser quando o que amo verdadeiramente é essa busca por descobrir-me nas entrelinhas das palavras escritas. Da moral ao ato há um hiato filosófico que me consome as horas a preenchê-lo.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Gozos Eternos

Eu gosto das podres dúvidas,
Anciãs que sobrevivem aos séculos,
Golpeadas em sítios arqueológicos,
Extraídas do chão com muito esmero.

Eu gosto das dores dúbias e dos finos ais,
Cercados por arame farpado
E marteladas na alma para uma vida inteira
De procrastinações e de encontros atrasados.

Eu gosto do silêncio mútuo,
Que permeia segredos, esconde mistérios,
E, num doce olhar, se defenestra,
Arremessando-se pela janela dos céus enviesado.

Eu gosto dos meus dedos tortos,
Que desdenham por este papel,
A procurar algum fim para a poesia toda
Ou para os rudes relevos que sobressaem à minh’alma.

domingo, 3 de janeiro de 2010

O que fazer quando se tem dois marfagafos com intestino solto arranhando seu peito?

A primeira instrução a respeito, que ouvi de um ancião num velho mosteiro, recomendava que se plantasse uma bananeira torta, com as duas pernas para cima; ressaltava ainda que o pé fosse de banana terra, variedade daquelas bananeiras estrelares que se cultivam em cada cratera da lua.

Depois, ouvi o conselho para que se escutasse samba, com duas porta-bandeiras guardando os flancos, fantasiado de toureiro ou tesoureiro e ensaiando os passos de um tango argentino.

Seguindo a reta desses conselhos lógicos, descobri, logo em seguida, que se deve aprender o húngaro, conversar em tal língua com os banqueiros e largar a mão em piparotes nas cabeças de prego.

Diariamente, também deve se soltar três vezes um grito de guerra, num palco montado no alto de uma banheira, contestar axiomas matemáticos e cear à hora do almoço fótons de luz à maneira dos gregos.

Por fim, para um problema tão indescritível, deve se cultivar uma gramática para cada verbo que a necessidade lhe faça criar; iniciar um diário que relate os desconfortos de cada dia, e amar deveras uma humanidade inteira.

Se ao fim, as dores umbilicais procrastinarem o seu fim, indefinidamente, para o dia seguinte, deve-se aceitar que tem um desatino amargo no peito, que não cura e não tem nome. Tem uma doença, no linguajar inculto, “filha-da-puta”, perdoem-me apenas o vocabulário alheio; para o resto não peço perdão.