Há algumas coisas sobre as quais vale a pena falar, uma
delas chama-se Krzysztof Kieslowski, cineasta polonês, conhecido por pelo menos
uma dezena de filmes. Este final de semana terminei finalmente de assistir a “Trilogia
das cores” (Trois Couleurs), formada por títulos cujos nomes fazem referência
às cores da bandeira francesa: “A liberdade é azul”, “A igualdade é branca” e “A
fraternidade é vermelha”.
O título das obras pode levar a crer que se trata de uma
obra social ou política, mas nem de longe a impressão é verossímil e identifica
esta obra magnânima. A temática dos filmes que compõem a trilogia são os
detalhes da vida, ou, para além, as profundezas da natureza humana. Confesso
que me sinto ainda em processo de digestão. Mas os filmes são todos construídos
pelos detalhes, o lustre azul que desperta as memórias do marido e filha
perdidos, a culpa por não poder conseguir lidar com a família de ratos que se
instala no porão, a música que vem da esquina do café; “A liberdade é azul”,
este primeiro filme parece-me um filme mais visual do que os demais, e
absolutamente não parece necessário mais diálogos para que o filme seja capaz
de fazer-nos sentir a dor e o desespero da personagem principal. Tudo acaba por
parecer muito frágil, uma ocasião foi o suficiente para fazer a vida da
personagem se despedaçar, perder o sentido. A vida (ou o homem) é muito frágil.
No segundo filme, “A igualdade é branca”, alguns sentimentos
conflitantes e até um tanto quanto obscuros parecem vir à tona. Um homem
rejeitado pela mulher, após o casamento fracassado, que o destrói e o humilha,
faz emergir no homem sentimentos conflituosos e nem sempre dignos de expressão.
Ele se vê obrigado a voltar ao seu país, onde, embora ainda amando a sua
ex-esposa, começa a arquitetar um engenhoso projeto para se tornar bem sucedido
e vingar-se da antiga mulher. O filme consegue explorar sentimentos desconfortáveis,
que com muito trato por vezes sublimamos. O fundo branco está sempre presente
na memória do dia do casamento, que é sempre resgatada.
Por fim, em “A fraternidade é vermelha”, percebemos certo
fechamento de um círculo, onde todas as histórias não existem de forma isolada.
A clausura do juiz aposentado, ressecado da vida, e que a meu ver representa a
personagem mais interessante neste filme, faz-nos perceber a vitalidade e a
força da memória e do passado na construção do homem presente. O homem capaz de
causar repulsa na modelo, personagem principal, pelos seus modos, tem a
capacidade de ser belo, de ser admiravelmente humano.
Nada disso diz coisa alguma da trilogia, além do que a
resume de forma muito má e tosca (culpo aqui, parcialmente, a minha disposição
madrugada adentro). A obra de Kieslowski ultrapassa a literalidade do
aparentemente ordinário de nossas vidas, com muita delicadeza e sensibilidade.
E ainda que não possa transpor isto aqui, resta o que eu disse ao início do
texto, há certas coisas sobre as quais vale a pena falar. E quem sabe, em algum
outro admirador da sétima arte, leigo como eu, isto também possa incitar a
curiosidade pela obra... o que já me valeria a postagem.
Bem... agora, a postagem já está justificada.
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