Em algum lugar da livraria...
– Eu estive pensando há pouco e cheguei a concluir, que a arte é deveras inadequada. Comecemos pelo custo. Sim, qualquer arte. Olhe, por exemplo, as obras plásticas, as pinturas, os espetáculos cênicos, o cinema...
– Sim, continue.
– A boa obra de arte não cabe no custo de um bom produto. O custo de um bom espetáculo nos teatros é muito alto para o brasileiro comum. Uma proporção pequena da sociedade tem permissão financeira para pensar no valor da arte. E não vale tentar consumi-la, sem pensá-la, pois se necessita primeiro compreender o que é arte.
– Deixe-me, tirar uma dúvida, um livro no sebo ou um disco ao custo de eletricidade também entram no rol das coisas financeiramente inacessíveis?
– A literatura é ainda pior. É como um tiro no escuro como fosse num mercado de finanças. Pois não se vê uma prévia do trabalho. Compra-se às cegas. E, atualmente, às cegas é que se tem produzido literatura. Portanto, é um risco; risco igual se oferece ao tateio da música. O custo é uma compensação, pois você sabe que o mau tato para estes assuntos se cria pelo contato obtido com a má obra. A escolha é o resultado de uma construção pessoal que leva em conta “por em referência aquilo que se tem anteriormente como arte”. E essa referência só se desenvolve com grandes obras.
– Sugere que esperemos ela extinguir-se, enquanto conversamos, e, daí então, figurar, finalmente, num museu de incompatibilidades humanas ou de paradoxos desenvolvimentistas?
– Não... Não aguardaria séculos por isso. Apenas observo e exponho certas coisas. Nada mais.
– É por isso que não se vive de arte, pois não se vive de cinzas.
– É, talvez esteja certo, já matamo-la. Contudo, nunca se sabe se há de ser dado um novo suspiro. A arte não se rende aos meandros da razão humana.